Vendas

Vende-lhes ou compram-lhe?

Pergunta curiosa. Então isso não é o mesmo? Vende-lhes ou compram-lhe? Na realidade não é, embora vá dar ao mesmo, mas com algumas subtilezas que convém analisar e, mais que tudo, compreender.

Diria que para se entender este assunto na sua totalidade é necessário percebê-lo através de três perspectivas diferentes:

  • Vender-lhes – A primeira é a abordagem mais tradicional, aquela com que a maior parte de nós está mais familiarizado. Estamos habituados a ver o vendedor fazer o seu trabalho, pegar numa carteira de clientes, fazer telefonemas, tentar agendar reuniões de apresentação de produtos ou serviços, tentar que o cliente se disponibilize para receber uma proposta, que assim que esta seja negociada se avance para a fase do fecho de venda e desta forma se conclua o processo. Dependendo do tipo de bens a transaccionar, estas fases poderão ser mais demoradas e ter lugar ao longo de mais do que uma reunião ou podem decorrer todas no mesmo momento. Às vezes em apenas 10 minutos.
  • Compram-lhe – É o que acontece aos vendedores sortudos quando estão em mercados em que aquilo que comercializam é tão importante para o cliente, que, independentemente do mau que sejam a desempenhar as suas funções, no final o cliente acaba por comprar. Porque precisa daquele produto ou serviço, porque aquela empresa é a melhor no mercado, porque há escassez de fornecedores, etc. O vendedor nem precisa de ter muitas habilidades ou competências, basta apenas aparecer e apontar a nota de encomenda. No meu tempo, e penso que ainda nos dias de hoje, chamavam-lhes os apontadores (porque só tinham que apontar o que o cliente queria) ou os aviadores (porque iam lá só para aviar notas de encomenda).
  • Compram-me – Este é aquela que considero ser a abordagem ideal do vendedor da nova geração. Nem lhes vende, nem lhe compram. Ele simplesmente aplica todas as técnicas de comunicação e influência, estabelece relação com o seu cliente no mais alto nível de empatia que dois profissionais com objectivos aparentemente adversos, mas afinal complementares, podem ter. É o vendedor que consegue rapidamente sintonizar-se com o cliente, reconhecer a sua personalidade, adaptar-se a ela para o poder servir melhor e iniciar um processo de consultoria comercial, ajudando o cliente a encontrar soluções para os problemas através dos seus produtos ou serviços. Habitualmente denominamos isto de Venda Consultiva. Quando o processo é bem feito, seguindo todas as fases, no final, não somos nós que vendemos nada, é o cliente que compra. Compra, mas não como no processo referido no ponto anterior, em que o vendedor não tem qualquer papel activo ou relevante no processo. Compra, mas compra-me a mim, que me posicionei como consultor, facilitador do processo do cliente para o ajudar a encontrar a melhor solução para o seu problema, o qual, frequentemente, pode acontecer ele nem saber que tem.

Como comprador e vendedor, já vi isto acontecer tantas vezes que percebe-se logo quem é que está na área das vendas por paixão e vocação (que se podem sempre desenvolver) e quem é que está para “safar uns cobres” ao final do mês porque não arranjou mais nada do que viver.

Lembrei-me de escrever sobre isto, porque no final do mês passado decidi comprar uns ténis específicos para utilizar no ginásio, nas aulas de grupo com bicicletas. Como comprador, o que eu mais ambicionava era conseguir fazer a melhor compra em termos de relação qualidade preço. Para isso contava que me explicassem como é que as coisas funcionam e quais os factores determinantes a ter em conta para tomar a melhor decisão. E essencialmente queria que, mesmo depois de pagar, não viesse a sentir o remorso da compra passados alguns dias, por não ter feito a melhor escolha.

Entrei numa loja de uma grande superfície dedicada exclusivamente à área desportiva e dirigi-me à zona que parecia ter o que pretendia. Não havia por ali ninguém, apenas eu e um vendedor que arrumava coisas. Fui ignorado durante algum tempo, até que não aguentei mais e perguntei se o que tinham era só aquilo que estava exposto (cerca de 6 metros de parede com expositores de alto a baixo – era pouco comparado com a concorrência). Disse-me, “sim, já só há isso” e continuou a arrumar. Adorei o foco dele no cliente e a dedicação em vender o que tinha. Tal como vendedor, também sou um comprador persistente. Atirei-me às caixas do meu número e fui abrindo e experimentando tudo, tentando adivinhar se aquilo servia para a função que queria e adivinhar os preços no meio de tantas etiquetas, algumas já com stock esgotado.

Depois de muito experimentar, sozinho e abandonado numa loja daquela dimensão, lá consegui encontrar algo que parecia servir. Levantei a cabeça e parecia que estava no deserto. Não se via ninguém. Apenas um ou outro cliente a passar por um processo semelhante numa outra “duna”, com produtos diferentes. Esperei até desesperar. Tive que fazer quase 100 metros até à caixa para pedir o favor de me virem vender uns ténis. Até foram simpáticos e disseram que logo me mandavam lá alguém, mas a verdade é que não veio ninguém comigo, mesmo estando alguns deles disponíveis.

Comecei a ficar perturbado mesmo a sério e pensei: “tu queres ver que estes tipos não me querem vender os ténis, agora que tive tanto trabalho a encontrá-los sozinho? Pois agora é que se lixaram. Estes já não os largo (estava com eles calçados e tudo)”. Voltei a percorrer os 100 metros de volta com aquelas solas rijas a ver se não escorregava. Nada podia impedir-me de lhes comprar aqueles ténis. Ao fim de uns 15 minutos, apareceu o mesmo tipo que estava a arrumar coisas, fazendo uma cara surpreendida por eu ter encontrado alguma coisa que me servisse. Como viu que eu estava mesmo decidido, lá me deixou comprar aquilo e tudo correu bem até ao final.

Tenha cuidado que estes vendedores do segundo tipo que referi acima são uma espécie que prolifera essencialmente nas grandes superfícies. Eles nunca vão Vender-lhe, você é que tem que Comprar-lhes! E você, como faz com os seus clientes?

Ricardo Laranjeira

Formador & Coach

Originalmente publicado em Ideias & Desafios

 

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