Desde tempos imemoriais líderes, vendedores de ideias, sempre utilizaram estórias para persuadir, negociar e, obviamente, vender. Entretanto, justamente no Século XXI, o ‘século do storytelling’ é que me deparo com líderes e executivos que temem lançar mão de princípios e técnicas de storytelling.
Segundo eles, não querem ser percebidos pela audiência como manipuladores ou emocionais. “Vou direto ao ponto, quando me dirijo a colaboradores e clientes”, dizia-me um jovem empresário, “o que interessa a quem me escuta e a mim mesmo são os fatos, nada mais que os fatos. Na posse dos fatos, tomarão as suas decisões”.
Sim e não, argumento eu.
Sim. Claro que os fatos devem ficar claros, por exemplo, numa negociação, ou você vai parecer um manipulador – estará a esconder os fatos. Só que não é apenas isto.
Não. Qualquer pessoa, do mega empresário, a comprar uma frota de navios mercantes, ao sapateiro da esquina as suas mentes e os seus corações serão movidos e mais eficazmente atingidos através das emoções. Quando usamos estórias para vender ideias ou para levar alguém a nos comprar ideias, se nos furtarmos da utilização de estórias vamos parecer falsos. Compramos e vendemos apenas para pessoas reais, não é verdade? Sobretudo, morremos de medo de lidar com alguém que não seja autêntico.
Se teme storytelling, deixe temporariamente o medo de lado, utilize e compare os resultados. As estórias como instrumento de comunicação fazem parte da natureza humana, não usá-las, o que é quase impossível, vai fazer você remar contra a maré.
Entendo que os conceitos por trás da utilização de estórias podem ser bastante complexos – storytelling virou esta espécie de ‘ciência’ -, mas isto é bobagem. Usar o instrumento-estória é muito mais fácil do que parece.
Nestes anos a tratar com estórias, tenho seis conselhos a quem, ‘desconfiando’ da importância na comunicação da estória como um propósito, decide mudar do discurso frio e antinatural para um discurso mais autêntico e natural.
1. Até adquirir o domínio das técnicas de storytelling, e até mesmo depois, planeie as suas estórias. Planear aqui, afirmo, significa algo bem simples: pense na mensagem ou impacto final que quer passar ou causar. Se tem apenas 10 segundos, planeie o fim surpreendente e um começo, um incidente inicial, que gere suspense. O bom utilizador de estórias, pensa na estória de trás para frente para depois voltar dando musculatura no meio, ao drama. O fim é crucial porque, nas estórias que usamos para persuadir, negociar e vender, o impacto final tem que permanecer, ser alguma coisa indelével. A sua intensão ficará clara ao concluir a estória. Se não ficar clara, você passará por um farsante ou enganador – talvez daí venha o temor inconsciente do jovem empresário com quem conversei.
2. Pense sempre na audiência. Você não está contando uma estória para agradar a si próprio. A sua estória deverá ter uma intensão e propósito definidos, deverá mover a audiência, levá-la a reagir naquele momento e a agir, também naquele momento ou no futuro. Qualquer boa estória transforma a audiência, que nunca mais será a mesma depois de o escutar a si.
3. As estórias com um propósito devem ter o tamanho que o propósito exige. Cuide para não se estender além do necessário. Se precisar de uma estória mais longa, utilize uma estrutura semelhante a um livro, divida em míni estórias, i.e., capítulos. De propósito secundário em propósito secundário, você atingirá o seu objetivo final. Os americanos sugerem que, num ambiente de trabalho, as estorinhas devem durar de três a cinco minutos. Nos países latinos você deverá adaptar a cultura, uma estória muito rápida poderá não ser levada a sério, as técnicas norte-americanas de persuasão, negociação e venda, com exceção de um grupo restrito acostumado com uma cultura estrangeira, soam ingénuas, quase infantis, próximas à comédia. Aqui o bom senso e a sensibilidade à cultura contam. Gosto de dizer que, quando vou ao cinema e a estória me envolve, fico colado ao ecrã por três horas e nem pestanejo. O tempo é mesmo psicológico.
4. Se precisar de inspiração, considere que uma boa estória é normalmente a respeito da superação de um obstáculo e, ao superá-lo, haverá uma espécie de transformação. Na verdade, aqui cabe uma ‘fórmula’: personagem excecional, que poderá ser você mesmo, a passar por um problema excecional, aparentemente insolúvel, sem os instrumentos adequados, para chegar a um fim satisfatório e, neste processo, se transforma. O que realmente agarra a audiência é como o personagem principal resolve os conflitos e que lições aprende com isso.
5. Sim! Quem vai usar um estudo de caso, o famoso ‘case study’, este também deve conter conflito. Simplesmente relatar o que foi feito, funciona como introdução a uma estória, cria expectativa para descobrir-se qual será o conflito, qual a batalha e como foi vencida e, ao vencê-la, como ou em que grau o personagem principal mudou. Uma simples lista de como solucionar o problema não passa de uma simples lista de como solucionar um problema. Como normalmente numa estória o problema acontece com outra pessoa, porque me deveria eu importar? Para que a audiência se importe você terá de envolvê-la, e a única coisa que nos envolve é o embate entre duas ou mais forças. (exemplo)
6. Um truque para que as estórias deem sempre certo é pensar nelas como um filme. Se há alguma coisa próxima do engajamento universal são os block-busters hollywoodescos. Mas tal com já referi acima, tenha em conta a cultura local. Um truque complementar, e este bem pessoal, é que, quando tenho de trabalhar com culturas diferentes da minha, investigo na Internet quais os filmes (por vezes incluo também peças de teatro e livros) que estão em cartaz naquele local ou sendo direcionados e consumidos por uma determinada camada social e por quanto tempo. Assim, tiro a febre do tipo de estória e estrutura dramática com a qual se estão envolvendo naquele ambiente. Interessante é que em países como a França, parece que podemos passar quinze minutos a mostrar as nuvens do céu antes de alguma coisa ocorrer na trama. Sem dúvida, se quisermos envolver meia dúzia de intelectuais, recorremos ao devagar (quase parando) do filme francês. Entretanto, se examinarmos bem, o filme francês, portanto local, está em cartaz faz uma semana, subsidiado pelo governo e talvez com sala a meio. Já o americano, em cartaz há um mês, mantém casa cheia. Em resumo, só porque estarei na França é que devo usar estórias francesas, mas pode acontecer que o francês queira algo à americana. Ao passo que, uma estória a ser usada numa palestra, digamos em Nova Iorque, se tiver um toque francês, poderá ser muito bem aceite, principalmente se o seu sotaque for estrangeiro. Nos EUA um estrangeiro a imitar um americano na performance de uma estória poderá soar ridículo para eles. Entendem que aquele ataque com estilo de pastor evangélico, com muita pirotecnia e nem sempre com muito conteúdo, fica bem apenas num sotaque norte-americano.
A isca, como diz um amigo meu, tem de ser boa para o peixe, não para o pescador. Por isso adapte sempre a estória à sua audiência e ao contexto que a envolve.
James McSill e Ricardo Laranjeira